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quarta-feira, 23 de maio de 2012

O CORPO BLINDADO PELA SAUDADE ADOECE

Em Provérbios, há um versículo que nos adverte dizendo que "um coração alegre é bom remédio, mas o espírito abatido faz secar os ossos".  Essa passagem sempre me falou fundo ao coração. Em muitas vezes situações de minha vida, corriqueiras ou não, esperadas ou não, as vezes até repetidas, algumas até pressentidas me abatiam de uma forma, que roubava minha alegria, mas poucas de fato me levaram a nocaute a ponto de secar alguma coisa.

Eu sempre pensei assim: o que será que de fato faz um osso secar, não deve ser imediato, tudo ao redor do osso deve ficar comprometido e depois o osso seco, só pode ser a morte. Assim imaginava, então na minha cabeça. tristeza leva a morte...abate, adoece e morre.  Beleza, não estou triste porque quero, vou adoecer e vou morrer, isso deve ser rápido. Tem tantas historias de pessoas próximas que morrem logo em seguida, e as pessoas dizem: fulana veio buscar sicrano, ou morreu de tristeza porque beltrano se foi.

Tinham historias assim, de mortes próximas, que eu achava até poética, não sei se é funesto pensar assim, também sei que por mais que seja desejo de A ou B partir junto com o amado, essa decisão e o seu resultado não estão em seu controle.  Então eu achava bonito, mas não tinha a compreensão que a decisão não era pessoal, tinha um ser que regia tudo, inclusive que interrompia nossas vontades.

Tentei ser um desses casos, e também tentei trazer alegria ao coração, fracassei nas duas hipóteses. A fonte para alimentar qualquer uma das duas não estavam disponíveis para meu acesso, porque eu não queria fazer esforço. Afinal, eu era a vitima, apesar de me sentir vilã muitas vezes, culpada em não ter protegido Rafael da morte e minha casa dos maus.  Mas mesmo percebendo que nem ficava alegre e nem partia, era inevitável que a sensação de um corpo que não pereceu no início traga em suas lembranças as feridas desta caminhada.

Passei os primeiros 15 a 18 dias de cara limpa, sem tomar nem analgésico, e também não comia, nem dormia, medos de tudo me assombravam,  fiquei sozinha nesse período no apartamento e mantinha a porta do quarto de Rafa trancada como se isso fosse favorecer o armazenamento das lembranças e de suas coisas. Mas passei a ficar irritada, passei a sentir uma dor de cabeça que ficava mais de 24 horas latejando, e aí busquei ajuda.

Necessário, imprescindível...mas paliativo, a dor não passa. No inicio só querida dormir, e nem com o remédio eu dormia. Dois meses depois, com quase 90 dias do falecimento peço arrego. Não durmo, sinto dores, não como, não quero ver gente, não quero saber de nada, não fico triste com a tristeza dos outros, minha dor é o centro do universo e Rafael o sol, só que meu eixo esta sempre no escuro ele não brilha mais em meu território, eu lembro da luz dele, mas não a vejo, não sinto, não me aquece...virou passado.  Arrumar isso tudo...loucura.

Vieram as dores, as crises de gargante, 06 em dois meses. 45 dias de antibiótico variados. Remédio para dormir, para não chorar, para conter a infecção, para a dor de cabeça (minha filha caçula, não me larga ate hoje...as vezes fica mais de 24 horas me azucrinando).

Até que as dores encontraram meus ossos, e depois de 10 meses, voltaram a atiçar meu quadril, meu ombro e todos os lugares onde a bursite ou a tendinite já existiam. Fiz algum esforço físico. Fiz e faço todos os dias. Respiro, sem sentir vontade. levanto, quando queria ficar prostrada. Como, mesmo sem ter fome, as vezes uma coca-cola e qualquer besteira, pode ser meu café, almoço e janta, lá pelas três da tarde, ou três da manha.

Onde dói? Mais fácil dizer onde não dói. Hoje, depois da missa, de uma noite divertida com os amigos de Rafa, depois de muita risada e muita saudade, chego em casa e o corpo não relaxa. Doi ficar em pé, sentada e deitada. Dói mexer qualquer coisa. Dói, dói de dentro e sinto fora. Não um lugar do meu corpo blindado pela saudade que não esteja dolorido.
Tem algumas referencias bíblicas que falam sobre secar os ossos.TEXTO EM EDIÇÃO

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