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domingo, 20 de maio de 2012

A CABEÇA BORBULHA E NÃO SAI NADA

Pensei em tantas homenagens, mas não sai nada. Travei nas mensagens do blog, travei em fazer camisas com suas fotos, atualmente as mais de 100 camisas com suas fotos povoam minha cama a noite. Olho leio e releio, choro, rio, abraço, visto, tiro, elas são mais reais que as fotos, de certa maneira vesti-las é como se de alguma forma me sentisse abraçada envolvida fisicamente por você.  Nos últimos dias tenho dormido também com elas, pois como o sono não tem sido habitual, nos cochilos, eu estou vestida com elas novamente.

Não consigo ver os álbuns, tem blusas que já foram selecionadas para novas artes, mas não consigo sentar lá na casa da cópia, onde já frequento há quase um ano, e digo, bem vamos fazer outras, algumas estão descolando, outras encheram de bolinha de tanto usar, outras perderam a nitidez e eu ainda não estou pronta para parar.  Se comprei roupa depois que Rafael partiu? Sim, emagreci, perdi muita coisa, entrei em outras já esquecidas no guarda-roupa, mas fora as blusas de algodão para plotar, comprei apenas 02 blusas que não se plota.  Por que? Sinto-me menos mal usando as que fiz em homenagem a Rafa.

Pensei que na próxima quarta, eu encomendaria um outdoor com uma foto linda dos dois Rafaéis e diria o quanto eles são especiais e o quanto sentimos saudades. Não consegui escrever nada, e quando consegui escrever não achei legal, e quando resolvi fazer de qualquer jeito, não dava mais tempo para quarta-feira. Pensei que um possível livro pudesse ser lançado, fui ficando desestimulada. Pensei que conseguiria fazer um lual, um culto, sei lá, reunir as pessoas mais próximas, ou ate a mesma missa que vou nos dias 23 e apenas choro, não sei dizer nenhuma mensagem que foi dita em nenhuma dessas missas, porque basta ouvir o nome dele, eu não consigo me concentrar em mais nada.  Nem sei porque continuei indo, na ultima missa, tinham três pessoas, eu, a avo paterna e uma colega da escola que foi para todas, ou quase todas.

Essa semana será implacável, quarta e sábado farão doze meses que eu e Neide não damos boa noite para nossos filhos, não os acordamos com o bom dia, não os vemos, não os tocamos, e tivemos que sobreviver a essa dor dilacerante que não dá trégua.  E sinceramente, nem o texto da lápide, nem a minha camisa, nem a minha homenagem, nem a gravação da música que eu apresentei a um artista local, nada virou real, e sinceramente eu adoraria que nem esse dia, 23 de maio de 2012 de fato seja real para mim, seria uma presente não ter que passar por ele, sei que ele doerá menos que o dia 24 seguinte, mas dói mais que todos os dias que vivi depois do 23 de maio de 2011.

As vezes eu acho que estou progredindo, tenho vontades de arrumar a casa, mudar a decoração, voltar a ligar para as coisas que eu gostava, cuidar um pouco de mim, fiquei tão largada, tão de qualquer jeito, aí me animo, mas não dura nada. No instante seguinte se pudesse e não sentisse dor nem sairia da cama (porque na crise de bursite no quadril, deitar e sentar tem sido um suplicio). Um dia eu acho que dei um passo largo para respirar outra coisa que não seja o luto, no mesmo dia, as vezes no mesmo turno, eu dou três para trás e me encho das perguntas: Por que? Por que comigo? Por que desse jeito? Para que? O que quer que eu aprenda? Eu não aprenderia de outro jeito? Por que sem pai e sem filho tão precoce? 

Tem dias que rio de tantas coisas: na casa de Cora, as piadas de Valter, as coisas que Rafa e Gabi falam, as loucuras da doidinha, umas postagens de Gui e Tico, uma coisa engraçada na tv (já consigo assistir um filme inteiro, sem mudar toda hora, sem levantar, sem ir 500 vezes no quarto de Rafa). Tem outros, que sinto uma culpa tão grande em rir.  Em usar um esmalte mais vivo, em vestir estampa, em ouvir musica (tirando as do pen drive de Rafa em dias muito, muito desesperadores), em me bonecar, em tentar ficar mais aprazível para mim mesma.

Tem dias que até pareço uma pessoa normal, mas quando me dou conta, não me sinto mais normal, porque não pode ser normal mãe perder filho e achar natural, em nenhuma hipótese, de nenhuma forma e em qualquer idade.  Normal, acho que não serei nunca mais. Essa ferida vem antes de mim, antes de me enxergar eu enxergo a ferida. Tem dias que fico pensando como Deus me vê agora e como Ele me via antes.  Coisas simples viraram um pesadelo para mim. Coisas prazerosas, viraram amarguras. E coisas abomináveis ficaram cotidianas. 

E isso não se chama doença alguma ou falta de fé. O nome disso é luto. Isso é perder alguém que você ama, alguém que você gerou com amor, alguém que lhe ensinou tudo que você sabia sobre você era relativo.  Alguém que lhe ensinou sobre um amor incondicional. Alguém que quando parte leva com ele seu melhor papel, a maternidade. E você deixa de ser mãe e passa a ser mãe-orfã  (orfão, diz-se daquele que foi desamparado, desvalido, que perdeu uma pessoa muito cara), é assim que me vejo muitas vezes.

Hoje, foi a primeira vez que almocei sozinha. Fico sozinha muito tempo, mas não almoço, não faço refeição, faço lanche. Hoje eu sentei e almocei e a saudade foi tão grande, tão grande, foi saudade com sabor, sabor do que a gente gostava de comer, foi a forma que achei de te sentir mais perto, porque não sei o que fazer,a  cabeça borbulha e não sai nada.


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