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terça-feira, 23 de maio de 2023

12 anos sem vc

 12 anos que me sustento num amor incondicional num exercício ininterrupto de testar a fé. Até aqui as misericórdias de Deus são a minha fortaleza. 

Tem dias que é o meu normal, racionalizar a respeito, espiritualizar o processo e a perda e tentar filosofar a experiência de viver sem você. Tem outros, que as atitudes precisam ser mais drásticas, porque a razão não dá conta da saudade, do vazio, das dúvidas de como seria ou ainda, de quanto tempo levará para o reencontro. Para esses dias, nosso universo é fundamental, e então lanço mão do nosso arcabouço de memória, e repito trilhões de vezes íntima e externamente que vai passar, respiro fundo e murmuro um dia de cada vez. 

Mas tem dias como hoje, que há 12 anos me reinvento.  Testei de tudo ao longo do tempo. Parece que o que faz o dia passar mais rápido, aliás o mês de maio inteiro, e funciona para mim é reverberar você.  E tento fazer isso na intimidade, todavia, tem horas que inunda, os olhos, a casa, a vida, a memória e aí deságuo aqui. 

Longe de ser uma forma de promoção pessoal (afinal quem gosta de viver dor e saudade?), mas acima de tudo promover você e agradecer a Deus pelos 17 anos ao seu lado. 

Você sempre foi o meu milagre. Primeira gesta e única levada a termo.  Gravidez bem complicada, parto da mesma forma e cinco dias de internação. Depois várias internações em decorrência da alergia severa, com alguns edemas de quincke e glote intensos, uma meningite aos sete anos com fortes convulsões.  Ainda assim, foi a criança mais disposta e alegre que conheci. Nunca vi acordando de mal humor, não sendo carinhoso, ou deixando de ser prestativo. 

Ao tempo em que crescia, vi na nossa relação uma cumplicidade, uma lealdade e uma parceria que julgava ser comum a qualquer relação mãe-filhO, julgava ser fruto do Complexo de Édipo, mas não era.  Era exclusivo de sua generosidade em me tornar uma pessoa melhor, ao me mostrar a vida pelos seus olhos: ao me impedir de pechinchar na feira pq dois reais mudavam a realidade de quem me vendia e não a minha; ao largar qualquer compromisso para prestigiar família; ao receber panfletos na rua para garantir empregos; ao fazer abaixo assinado para não permitir demissão injusta; ao oferecer casa para colega recém conhecida; ao oferecer colo e ouvido para os que procuravam e em especial, a mim, ao me dar os abraços mais acolhedores e os olhares mais compreensivos sem precisar dizer uma palavra. 

Xeberel nasceu de sua espontaneidade quando eu chegava e saia de casa. Fazendo duas faculdades e um emprego público desde seus nove meses exigiam muito jogo de cintura para estarmos juntos. Mudei sua rotina para te ver ao sair e chegar em casa.  E fazia disso uma festa, cheia de rimas que você ria (Xeberel e Rafapel eram as preferidas),  para que déssemos valor ao porto seguro de ter para onde e para quem voltar. Julgava te preparar para perder e não julgava que poderia perder novamente. 

Priorizei nossas refeições e banho juntos (e nossa parceria nas águas rasas e profundas). Não cabia tv nestas horas, e nos apaixonávamos pelos universos alheios nos nossos papos à mesa.  Essa foi a rotina mais difícil de estabilizar com a sua partida.  Criei hobbies tão nossos e códigos tão íntimos que posso assegurar que você me conhecia mais profundo que qualquer ser que já conviveu comigo, ou qualquer terapia que eu tenha feito, daí também a raiva na hora dos aborrecimentos porque você já sabia que eu não ia gostar, a ainda assim fazia. 

Nunca quis propagar perfeição, mas sempre enalteci o meu menino homem protetor e honesto. Que tinha sede de justiça e uma humanidade afetuosa e conseguia fazer isso ser leve.  Um olhar de tentar ver o melhor do outro, e várias vezes me dizer “mãe deixe o cara, já não sabe que é isso”, tipo para que perder tempo com isso.  Ou em coisas mais serias que eu não via saída e a criatividade dele estava restrita, já me dizia, “se não pode fazer nada mãe, faça tudo, ore”. 

Hoje é um dia assim, cheio de oração. Construir uma a rotina para 23/05 é a coisa mais difícil do dia, porque ele é impregnado de seu cheiro; de sua mão esquentada pela minha; da memória de meus dedos entre seus cabelos; de sussurros para você levantar dali; do beijo em seu rosto pálido e frio; do som do louvor que pedia para Ana Rita cantar; do desespero de chegada da hora do adeus; do barulho da chuva sobre mim enquanto escrevo seus dados na lápide;, do loop de perguntas a Deus do porquê de novo comigo e com meu único e de que me desse forças; e do medo de uma vida sem você. 

Daquele dia 23 para hoje tem também a chuva que cortou a madrugada e me permitiu o banho lembrando a gente e um olhar no futuro.  E por mais doído que seja o dia e as lembranças do adeus, eu ouço “anjo” eu gosto de poetisar a ideia de que você é o meu. Meu anjo, meu amor Rafael, meu Xeberel! 

Até breve, filho! Se eu pudesse agora materializaria meu beijo de batom vermelho em sua palma da mão, só para dizer que estou aí, e que carrego você sempre aqui. TE AMO!