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sexta-feira, 27 de julho de 2012

QUANDO A MORTE SE FAZ VIDA

Durante todo o tempo do meu dia, eu penso na morte. Eu vivo muito isso ainda. Pelo vazio que restou, pela ausência física de meu filho, pela solidão, pela tristeza.  Tudo é muito morte, tudo é muito morto.  

Nesta caminhada tenho conseguido dar as mãos a algumas mães que também atravessam seus desertos de sequidão. Desertos do vale da morte.  Há uns meses, uns três, quatro, eu não admitia falar morte, ou filho morto,  ou morreu. Eu usava tantos sinônimos para me referir a sua ausência, menos a morte.

Eu não me permitia pensar na morte, eu pensava na perda, eu pensava que isso nunca seria reparado, mas em morte, não. Doía fundo. Falar da morte então. Nunca, e digo NUNCA dei detalhes a ninguém sobre a morte de meu pai. Fui a unica a ve-lo saindo do mar ainda de pé, olhando para o infinito. Eu tentava me encontrar no olhar dele que ja nao tinha foco. As duas contas verdes dos olhos dele se misturavam no horizonte perdido da morte que se instalava.

A primeira vez que pensei friamente na morte de Rafael, meu estomago embrulhou. Meados de outubro para Novembro de 2011, vendo o processo com as fotos de Rafael e o laudo técnico. Era diferente do óbito, não era um pedaço de papel, meu filho ali estendido era o retrato, a concepção da morte, até então tão abstrata, embora a consequência dela tão real em minha vida.


Hoje ao conversar com algumas mães, quando falamos, hora do óbito, causa do óbito, circunstancias do óbito. Ou meu filho morreu, quando meu filho morreu, depois que meu filho morreu. Eu pronuncio essas coisas e não é natural, é como se arrancassem de meu estomago cada letra pra formar essa palavra. Não é entendível dizer que estão mortos se vivem desse jeito dentro da gente.  Quando as pessoas dizem que tem a sensação de que eles vão voltar , vão abrir a porta a qualquer momento, etc.  Eu digo sempre que não tive a sensação, mas tenho o desejo de que isso aconteça todos os dias, era como se eu desejasse um antídoto para que as letras que formam a palavra morte não pudessem ser pronunciadas.


E nestes meus devaneios, eu sempre penso, na morte mas do que o que eu desejaria, e assim pensar na morte se mistura em pensar na vida, na vida que Rafa deixou para trás, e na minha que não segue em frente.

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