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domingo, 4 de dezembro de 2011

EM CARNE VIVA

Um dia lindo de sol  a vida continua lá fora, eu contemplo pensativamente, olha as parcas nuvens que se formam no céu, tusso um pouco, ela, a gripe, e a outra dor, a saudade, brigam por minha atenção pela manha, vence você.  Fico imaginando como você está, faço desenhos no céu imaginário do mundo que acho que você vive e me permito sonhar um pouco com essas caminhadas em estradas tão diferentes mas com sentimentos tão iguais: o amor, sei que você continua exalando amor.

Domingo, depois de uma semana de clausura e tosse, saio para almoço em família. Beira do rio, aquele rio, quantos mergulhos, dada hora vou ao banheiro, vejo lanchas dançando no rio, veio você com toda intensidade para meu coração doído, cansado e saudoso. Não segurei, a saudade inundou os olhos. Não consegui segurar mais, calei, olhei para o infinito e te desejei bem, desejo que aí de fato não tenha nada disso, saudades.

Pensava todo o tempo, como e quando isso vai passar, é como ferida que não cicatriza, aliás, alem de estar em carne viva, parece que a todo instante: o céu, o mar, a chuva, a letra, a frase, a ideia, a comida, a lembrança, os amigos, as pessoas, o cheiro, o som, a musica, o dom, a risada, o olhar, a voz, o tom, o toque, o mundo, o tudo, o nada, o barulho, o silencio, absolutamente todas as coisas me fazem  magoar a ferida, como se fosse vinagre no corte.

Apaguei a tarde, precisava depois de noite bem mal passada, tossindo, acordei com a poesia pronta...passei para o papel, depois fui em seu orkut, sua, Tia Jaque,  tambem lamentava sua falta, te deixei um recado e fui olhar o resto do domingo nas janelas do apartamento. 

Entrei em seu quarto e me enchi de você, de nós e de Deus, as vezes até entendo Deus, em outras não entendo mais nada, nem a mim, nem a vida, nem a Deus e por mais estranho que tudo pareça, só me permito te entender, mesmo sem te ver, te achar, as vezes te sentir...continuo te entendendo, como foi a vida inteira.

Tenho consciência e esperanças de que um dia esse vinagre não arda tanto, ou que meu limiar de dor aumente e eu me acostume com essa intensidade o tempo inteiro, lembro de você e as inúmeras internações e quando as enfermeiras perdiam a veia e você chorava e depois eu dizia segurando em sua mão, para que olhássemos o quadro ou qualquer coisa que eu achasse no quarto e a gente ia descrevendo a figura, e assim eu tirava sua atenção do foco da furada e você passava por aquilo sem muitos choros.

Essa semana tirei sangue no mesmo laboratório que te levava, chorei. Não pela dor, de tirar o sangue, mas aquela que veio quando vi o desenho do dálmata na parede, o mesmo desenho que você, já grande, entrou comigo e disse vamos mãe descrever quantas manchas tem o cachorro, você lembra de cor? A atendente me perguntou se doeu, eu respondi, ainda dói e doerá o resto da vida, está em carne viva...ela não entendeu nada, deve ter achado que eu fiquei louca.

Torço que essa dor me deixe ver outra coisa além dela, mas a carne nunca cicratizará, quem sabe a alma, o espirito e a emoção...mas a carne, será sempre carne viva. Defendo que cada pessoa lide com o luto à sua maneira e, de um modo geral, hoje o tempo não é remédio, já escrevi sobre isso, ma imagino que venha a ser um bom aliado, mas talvez a ferida nunca chegue a cicatrizar, e sei que  é impossível viver o resto da vida “em carne viva”.

Acho que de alguma forma na noite mal dormida pensei sobre isso, só não lembro, mas lembro das linhas quase prontas que me inspiraram pela manha, e quis dar a elas um rosto, o rosto da minha dor, minha carne, pois foi gerado da minha carne e do meu sangue, minha carne viva, pelo menos dentro de mim.




Poxa, a vida podia ser transgredida,
devia ser alterada, tantas coisas injustas,
como tudo junto separado, e separado todo junto,
dúvidas que Rafa sempre me questionava, pensando nelas,
nas duvidas, defendo que devia ser proibido
sentir esse nó na garganta, essa coisa tão má, 
de uma pessoa tão boa.
Queria gritar, quebrar tudo, reclamar,
mas minha voz não ecoa.
Queria dizer que não quero ficar
ou que quero sumir mundo afora.
Não entendo como alguém com tudo para dar
teve que ir embora, sem tempo de nos falar.
Devia ser proibido ficar do lado de cá,
enquanto essa dor magoa e a lembrança nos faz chorar,
e ter que calar, por mais que me doa chorar e ficar sem ar.
Sem dizer adeus e ver voce ir embora, 
você partir e eu ficar...
Devia ser proibido Rafa,
ou adiado para outra vida, outra hora.
Amo você...eternamente minha carne viva.
Sua, sempre, mãe...

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