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segunda-feira, 18 de junho de 2012

POR QUE É DIFÍCIL LEVANTAR?

Obviamente que as pessoas reagem diferentemente  a quase todas as coisas na vida. Nem todo mundo tem medo de barata, tem medo de morrer, de dormir só, ou tem medo de ficar sozinha, do escuro, de agulhas, de injeção, de ficar doente, de comida pesada, de moto, de avião, de dirigir, de andar de cavalo, de patins, de bicicleta. Ou medos adultos, de desempregar-se, de reprovar, da violência, dos filhos não serem felizes, ou de morrer e eles ficarem órfãos (nunca aceitamos o pensamento de que eles morram primeiro). Sei lá, acho que cada um tem uma forma diferente de reagir aos estímulos do mundo.  

Fui uma criança bem medrosa. Tive medo de todos os bichos possíveis e imagináveis, apesar de ter um mini zoológico em casa.  Tinha medo das galinhas, medo das ovelhas, do bode então corria, do veado, nem comida eu dava, do pastor alemão, só passava perto se meu pai estivesse segurando a coleira, e do cachorro que ele me deu, ainda de dias, no segundo dia o cachorro já latia para mim e eu deixei a maternidade, logo, logo.  Resultado, meus bichos se resumiam apenas aos pássaros da gaiola, e depois que eles morreram, ainda tentei com uns preás que também morreram, e por ultimo com Nárnia, uma cachorra que ficou comigo 01 mês e pouco, falecendo no dia seguinte ao dia que Rafa completava 06 meses de falecido.

Depois disso, só peixes, de verdade e os de vidro, no consultório e em minha sala do trabalho.

Mas meus medos iam além. Tinha medo de ficar sozinha no sítio, e fiquei algumas vezes com os meninos pequenos. Ir de um comodo ao outro, naqueles 14 cômodos era um suplício, principalmente depois da morte de meu pai, que minha mãe passou a trabalhar em horário integral.  Também tinha medo de ficar no quarto da casa de minha avó, um que foi objeto de muitos medos que a irma de minha mãe me submetia. Por conta disso, fiquei com medo de tudo que era imagem, imagem de santos nas igrejas, imagem de carrancas do São Francisco, imagens de santos nas lojas de produtos religiosos, aquelas partes do corpo que as pessoas deixavam nas igrejas em busca de milagres.

Depois comecei a ter medo de pensar em morte, de trocar o bojão, de que Rafael não respirasse e morresse numa crise alérgica, medo de que ele fosse maltratado por alguma babá, medo que ele não fosse feliz, sei lá...acho que eu era um medo ambulante. Até que Rafa cresceu e apresentou seus medos, medo do escuro, medo de ficar sozinho, medo de injeção...tinha chegado a hora de eu crescer.

Nunca tive medo de morto, de cemitério, destas coisas. Mas sempre que eu ia a um enterro, e só ia se eu conhecesse a pessoas que morreu, ou alguém muito, muito próximo a ela. Então eu nem ligava muito para a condição humana de quem morria, embora precisasse ver o caixão para me convencer, mas meus olhos sempre estiveram voltados para os que sofriam aquela perda.  Continuo sem medo, mas não tenho a menor vontade de participar novamente de nenhuma cerimonia desta natureza, nem das visitas subsequentes aos que choravam aquela perda.

Não tenho medo de nada, aliás não tinha. É como se eu nunca tivesse tido esses medos. Bichos, não tenho medo de nenhum, talvez de cobras, porque não sei distinguir a venenosa das outras.  Os demais animais, descobri que eles tem medo da gente e na maioria das vezes, eles só se protegem. Ratos...fui monitora de uma disciplina na Universidade Federal de Sergipe, em que os alunos ficam 01 ano condicionando comportamentos no rato e observando as premissas da teoria comportamental.  Quanto aos santos e imagens, não gosto mesmo, não é medo.  Não gosto.  Ultimamente tenho colecionado estatuetas de mulheres com filhos no braço, tenho atualmente 09, é uma forma de espalhar pela casa a maternidade...sinto falta disso. Mas são estatuas, não imagens.

Perdi o medo da panela de pressão, de trocar bojão de gás, de escuro, ou de dormir sozinha, ou de ficar sozinha, ou de violência, ou de morrer, ou de perder qualquer coisa.

Ganhei um novo medo...medo de levantar, medo de continuar vivendo.  Medo de que alguma coisa faça a diferença em continuar viva sem Rafa. Medo de não cumprir o que prometemos, medo de conseguir ser normal sem ele. Medo da vida, e anseio pela morte, pelo reencontro...pelo fim de tudo isso que dificulta que eu me levante.


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