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segunda-feira, 11 de junho de 2012

PARA ONDE OLHAR

Eu fico boa parte do tempo questionando para onde olhar, em que direção andar. E serio que o que mais desejo no mundo, pelo menos neste mundo sem Rafa, é dormir, dormir numa boa, dormir no horário que todo mundo dorme, dormir sem remédios, dormir até sentir que não aguento mais dormir, até sentir aquele cansaço de ter dormido tanto, aquela moleza gostosa no corpo, aquele sono que alimenta e rejuvenesce.  Mas até isso acontecer, para onde olhar?

Hoje vi um filme baseado na historia de um adolescente que no primeiro ano da faculdade, morando longe dos pais, liga para eles numa noite e no dia seguinte ele entra na faculdade atirando, e mata alguns adolescentes e depois se suicida. Mas quero me deter na historia dos pais daquele menino, após a sua morte. A crise que enfrentaram, a separação e depois a reconciliação. O menino era filho único, e como foi responsável pela morte de tantos outros adolescentes, aqueles pais não puderem sequer enfrentar o luto com dignidade, uma vez que o apelo da imprensa e da comunidade os fizeram se afastar inclusive da casa onde moravam.

E falando nestes pais, muitas vezes durante os diálogos deles, se questionavam, onde tinham errado. Questionaram a fé, deixaram de ir para igreja, os próprios irmãos da igreja, pessoas e por isso falíveis independentemente de religião, também os criticavam duramente.  Também se afastaram dos empregos, e o retorno do marido foi extremamente conturbado, e a esposa não retomou o trabalho.  E finalmente, culpavam-se. Culpavam-se por não ter percebido, culpavam-se por não se acharem presentes durante aquela "crise" do filho, questionaram a criação, os valores, a genética, a vida. 

Durante o filme eu pensava, Senhor já pensou se além dessa dor, eu tivesse que carregar a dor da culpa de Rafa ter contribuído com a morte de alguém? Pior que levei por muito tempo, achando que Rafa tinha sido responsável pela morte do amigo, também vitimado no mesmo acidente.  Acho que a culpa ainda vem algumas vezes, mas de forma mais branda, pelo carinho dos pais do outro Rafa, por não ter sido Rafa pilotando e o mais importante, porque eu não tenho controle sobre a morte ou a vida de ninguém, nem tinha sobre a vida de Rafa.  Isso é com Deus.

Mas voltando a culpa, e aos questionamentos infindáveis que durante a falta de sono e minha opção de vida, involuntariamente me controlam. Acho que a culpa deve ser pertinente a todos os pais independente da causa morte de seus filhos. Acho que quando são vitimas de doença, nos questionamos porque não percebemos, porque não evitamos isso ou aquilo. Quando são vitimas de acidente, questionamos porque não levamos e buscamos, ou porque demos determinada coisa para eles andarem, ou porque não proibimos a amizade com beltrano e fulano, e as vezes nenhuma destas hipóteses são verídicas. Não que sejamos perfeitos, mas de repente o livramento de morte de nossos filhos não cabe a quem não é Onipresente, Onipotente e Onisciente, como os pais.

E imagino que não saber para onde olhar é comum para pais que perdem filhos, e talvez mais causticante para os pais que perdem filhos únicos.  Acho que ficamos muito tempo perdidos, sem saber para onde olhar...e muito tempo olhando para a nossa dor.  Hoje, o único plano que tenho antes de descobrir para onde olhar novamente, é apenas dormir, sem sentir tanta culpa por não ter impedido Rafael de ir para a Praia do Saco naquele fim de semana, ou de quando meu coração apertado naquele domingo sem saber o motivo ter ido busca-lo e traze-lo para nossa casa.

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