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quinta-feira, 9 de junho de 2011

ATRAVESSANDO MEU DESERTO

Não é a primeira vez que enfrento um deserto. Aliás a minha vida foi cheia deles. Cada um em uma época diferente, uma idade diferente, percepções  e estrutura também diferentes. Cada um exigindo novas habilidades para sua travessia.


Em uns, o terreno mais pedregoso, arenoso, onde o vento batia forte açoitando-nos constantemente. Em outros paisagens tão áridas que muitas vezes achei que não fosse sair com vida dele - e nesta análise, eu me reporto a vida biológica, vida psicológica e vida espiritual, a sensação é de morte nos três âmbitos.  Em outros eram planícies cortadas por rochas tão íngremes que eu sabia que anunciaria um vale, e que poderia achar água, mas a travessia tinha me levado tudo, até um pouco de mim mesma: de minha confiança, de minha determinação, de minha perseverança e da capacidade de sonhar.

Num deserto a gente anseia por comida, água e conforto. Também ansiava por segurança. Segurança de que tudo ia acabar bem, segurança de que iria sobreviver, segurança de que depois da travessia o vale era lindo e habitável, segurança de que não estava sozinha. Mas durante o percurso, é tão difícil sentir estas coisas. As vezes alguma delas até estão lá,mas ficamos tão envolvidos com o trajeto que só depois de chegar ao destino percebemos que fomos muitas vezes ajudados. As vezes, por um vento menos forte; por um animal mais abusado que por ter habilidades para viver ali, nos seguem, nos acompanham; pelo frio cortante das madrugadas que esfriam as temperaturas do solo para nossa travessia durante o dia ou pelas estrelas que vão iluminando o caminho, já que são tão raras nos desertos.

Outra coisa que nos acompanha no deserto são as dores. O deserto exige tantas habilidades para conviver com ele, que quase sempre levamos nosso corpo a exaustão, então aparecem as dores físicas, consumidas ainda pela ansiedade em passar por ali, pela angústia de que tudo acabe, pela solidão que cada um carrega, pois cada um possui seu próprio deserto.  É a mesma sensação causada pela separação de alguém querido, todos muito próximos sentem a dor provocada pela distância, mas cada um do seu jeito a elabora e a expressa. Isso pode ser um deserto. E essas dores que só eram físicas, por analogia ao esgotamento físico a que o deserto nos submete, passa a ter conseqüências emocionais, psicológicas, espirituais, sociais, etc.

Eu posso falar de alguns desertos. Perdi meu pai com 12 anos. No ano seguinte um tio, muito chegado ao coração foi afastado de nosso convívio e de sua liberdade por mais de ano. No ano seguinte perdi tio materno e no ano seguinte avô paterno. Mesmo que alguns eventos não tenham sido compreendidos  por mim em sua totalidade, todos eles nos jogaram no deserto junto com minha mãe, pois com a morte de meu pai, ela assumiu todo o controle da família - filhos com 12, 09 e 1 ano de idade- e da família de meu pai e de certa forma, da familia dela, pois era consultada para apontar o que fazer em todas essas situações. 

 Este foi um deserto longo, cruel, que deixou marcas irreparáveis e uma saudade muito presente, mesmo que passados 26 anos.  Mas o deserto relatado acima não foi escolha minha, eu simplesmente dormir e acordei no meio dele. Quando meu pai faleceu - e nunca escrevi sobre isso, e poucas vezes falei - ali na minha frente, nós estávamos acampando, toda a família reunida, uma pescaria planejada há meses, e um dia todo especial, eu não tinha nem almoçado ainda, e de repente, eu estava no deserto.

Todavia tem os desertos que nós mesmos provocamos com nossas escolhas...e provoquei alguns. E o pior: não fui submetida a andar por eles sozinha, arrastei pessoas importantes para andar comigo e a dor doía mais forte porque eu já sabia o que um deserto exigia. Tentava carregar as pessoas no colo, como uma forma de amenizar o deserto para eles, como também de demonstrar que me sentia culpada pelo que havia provocado. Provoquei desertos com minhas escolhas. E só muito tempo depois entendi que as pessoas que estavam do meu lado no deserto, também tiveram a chance de sair, mas quiseram estar comigo confiando que viveríamos algo melhor lá na frente.  Espero muito que o saldo destes desertos tenham sido positivos.

Também tem os desertos que mal abrimos o olho e percebemos que fomos atirados lá, pelas escolhas dos outros. Pessoas que, como eu, escolheram errado e por nossa ligação sanguínea, nos impõem à dura, seca e solitária vivência árida do deserto.

Mas agora quero falar do deserto que atravesso. Esse, o mais cruel de todos. Não ameaçado nem de longe pelo que pode acontecer no futuro, e que eu desconheço, mas acho que nada pode ser pior que isso, aliás só uma coisa pode ser pior que isso: Deus desistir de mim...e a garantia de que isso não vai acontecer eu tenho, e que Ele me ajude a nunca desistir Dele.

Sabe quando o deserto é tão cruel que você nao enxerga o solo? Que você não faz idéia de onde esteja, para onde vai e agora não vê sentido em atravessá-lo? 

É assim que me sinto hoje - passados 16 dias sem meu filho unigênito do meu lado, independente do terreno, do deserto e dos desafios, meu grande e único companheiro de jornada, que em nenhum momento da travessia reclamou dos desertos a que foi submetido- sem chão, sem sede, sem forças para procurar a saída, e no meio desse desespero e apesar de tudo, hoje, em outra idade, outra percepção e outra estrutura, percebo que não saí de nenhum de meus desertos com a minha força.Deus sempre esteve lá.

Agora que nao tenho forças para andar, e posso confessar, nem vontade de sair do lugar, Ele, meu Senhor e Deus meu, tem me carregado nos braços, hoje eu vivo um pouco daquele texto lindo, Pegadas na Areia, na minha trajetória dos últimos dias, Deus tem me carregado, e me assegurado que o meu poço de aguas no deserto, meu oásis está ali na minha frente...Ele, minha fonte de água viva.

Uma vez, no meu deserto anterior, em 2009, o Senhor me falou ao coração, e essa palavra tem me sustentado ate agora, pois os desertos geram aprendizados e eles são imprescindíveis para os próximos desertos, quero relatar aqui, que o Senhor, Ele mesmo, me chamou ao deserto: 
"Portanto, eis que eu a atrairei,e a levarei para o deserto, e lhe falarei ao coração.E lhe darei, dali, as suas vinhas e o vale de Acor por porta de esperança; será ela obsequiosa como nos dias da sua mocidade e como no dia em que subiu da terra do Egito.Naquele dia, diz o SENHOR, ela me chamará: Meu marido e já não me chamará: Meu Baal." (Oséias 2:14-16)

No meu novo deserto, o Senhor tem me falado desse jeito:
"Os aflitos e necessitados buscam águas, e não as há, e a sua língua se seca de sede; mas eu, o SENHOR, os ouvirei, eu, o Deus de Israel, não os desampararei. Abrirei rios nos altos desnudos e fontes no meio dos vales; tornarei o deserto em açudes de águas e a terra seca, em mananciais." (Isaías 41:17-18)

Ainda não sei responder muitas coisas, entre tantas, ainda não sei o que o Senhor quer que eu aprenda com isso tudo - porque Rafa, não precisa aprender mais nada, ele foi chamado para estar com o Pai, e o meu Deus é Deus de vivos e não de mortos, Rafael vive na eternidade, num lugar lindo que anseio em ir também - mas tenho convicção baseada na fé que Ele gera no meu coração, e sustentada pela Sua palavra, de que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que O amam, e eu O amo Senhor, e meu filho também O amava.

Apesar da dor insuportável, da angústia da separação, da saudade sufocante e de tantos outros sentimentos que sei que o Senhor está vendo e vai sarar, obrigado por estar sendo paciente comigo, me tratando, me cuidando e me carregando neste deserto. 

Eu estou sedenta Paizinho neste deserto.Eu tenho sede Pai...sede de Ti.





Um comentário:

  1. Sei de tua dor... e sei como é pesado, as vezes ficamos na profunda escuridão, mais é nessa hora que Deus estende a sua mão segura firme e vá, não olhes para trás segura na mão de Deus e vai. Com certeza seu filho amado deve estar olhando por ti e nunca te desampara, ele quer que continue sua jornada e que não fique triste pois esta do lado do pai que nunca desampara. Creia nisso e segue seu caminho. muita luz e amor pra você.

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